Porque é que tantas organizações lutam para executar estratégias incrivelmente montadas? Ou será o Hoshin Kanri, ou o Desdobramento Estratégico, o elo que falta na execução estratégica?
“Começar com o porquê” é bastante consensual quando se aborda a necessidade de alinhar uma organização em torno da sua estratégia. De facto, as organizações, como os indivíduos, carecem de um sentido de propósito, de direcção. Mas a maioria das organizações não falha na criação de uma visão convincente para o futuro nem mesmo na sua comunicação através da organização. E é por isso que nos devemos focar na execução, como equipas, pelo fluxo de valor.
Estratégia Está na Moda
Sou de uma geração que realmente acreditava que criar uma estratégia era o foco da alta administração. As universidades atiravam-nos Estratégia e aprendemos a não ter conversas sem nelas usar a palavra mágica. Livros e livros foram escritos sobre estratégia, e nem uma palavra sobre execução estratégica. Suponho que havia a crença de que se a estratégia fosse convincente o suficiente, as pessoas simplesmente a seguiriam e fariam acontecer.
Portanto, quanto mais focados na criação de estratégias fascinantes, maior a nossa surpresa quando não as víamos descolar e maior a nossa frustração perante a aparente falta de capacidade de execução das organizações.
Não Podemos Melhorar o que Não Podemos Medir
Não podemos melhorar o que não podemos medir, mas isso não significa que podemos melhorar algo só porque o podemos medir.
Se não conseguíamos ganhar tracção numa óptima estratégia devia ser pela falta de alinhamento, tão focada no alinhamento da organização pela implementação de alvos em todas as camadas da organização. Scorecards tornaram-se tendência e os indivíduos passaram a ser recompensados por alcançar as suas partes do objectivo.
O exercício passou a ser "como partir um objectivo" mais do que "como o alcançar". As recompensas seguiram aqueles que conseguiram alcançar os seus objectivos, independentemente da colaboração para um novo nível de desempenho da organização como um todo.
Enquanto diferentes departamentos são pressionados para atingir os seus objectivos, muitas vezes visando o desempenho local em vez do desempenho do fluxo de valor, a colaboração parece cada vez menos benéfica para a realização de cada objectivo de função.
A maioria das empresas está estruturada verticalmente em funções, tal como as metas de desempenho. Os indicadores-chave medem cada função ou processo individualmente, e não como contribui para o desempenho global da empresa. Apesar do valor fluir de processo para processo, integrando a maioria das funções dentro da organização, não existem medidas de desempenho que realmente meçam como o sistema funciona em conjunto.
Não sou especialista e acredito que muitas empresas encontram maneiras de quebrar as paredes dos seus departamentos e conseguem trabalhar de forma eficaz em todos os seus silos, e devemos elogiar e aprender com elas. Tive a oportunidade de observar dois esforços recomendáveis, que penso valer a pena partilhar.
O primeiro está relacionado com a criação de Gestores de Fluxo de Valor, autorizados a gerir fluxos de valor por toda a organização, da encomenda à entrega, com medidas de desempenho como o tempo de rendimento do fluxo de valor, custo de vendas, entrega a tempo e outras medidas que reflitam quão eficazmente a organização é face às expectativas dos consumidores. O segundo método é através do Hoshin Kanri, também conhecido como Desdobramento Estratégico.
Origens do Hoshin Kanri
Deming é conhecido por ter tido a maior influência nas práticas industriais no Japão para o ciclo de Shewhart, que é actualmente apelidado de PDCA. Mas a sua influência foi muito mais ampla, dado que introduziu a noção de qualidade como um processo de gestão impulsionado a partir do topo. Por isso, não é surpreendente afirmar que o Hoshin Kanri tem origens na Casa de Qualidade de Deming (visto mesmo nos formatos commumente usados) e o seu uso inicial era provavelmente para comunicar a política da empresa a todos na organização.
O Hoshin Kanri provavelmente já foi usado para o propósito que conhecemos hoje, algum tempo após a extensa formação de Deming no Japão em 1950, mas foi nos anos 60 que o principal apareceu na literatura. O Policy Deployment, como foi nomeado pelas empresas dos EUA, foi trazido por empresas norte-americanas que tinham subsidiárias no Japão, então o Hoshin Kanri chegou finalmente ao mundo, 20 anos depois.
Integração a Partir do Topo
O Hoshin Kanri não assume a liderança para transformar a organização, mas estabelece o cenário para as diferentes equipas da organização se comprometerem a atingir metas que não tenham um só dono.
A criação de uma estratégia pode ser uma tarefa soltaria, uma vez que requer alguma criatividade introspectiva e assunção de riscos que não podem ser feitas colectivamente sem colocar muitas limitações no processo criativo. Assim, o processo de Hoshin Kanri começa com um objectivo e meta definidos: a participação da equipa de gestão que é chave para a organização.
O seguinte nível de liderança é chamado a definir as iniciativas que precisam de acontecer ao longo da organização, para que esses objectivos possam ser alcançados. Pode parecer uma diferença subtil, mas a liderança superior é chamada a desenhar o futuro sistema que conduza a um resultado diferente, em vez de batalhar individualmente para alcançar um número-alvo no seu relatório.
Juntos são chamados a imaginar um novo “estado futuro”, e depois concentram-se no caminho para lá chegar. É o caminho que requer todo o foco e todo o crédito, e cada membro é chamado para viajar em conjunto.
Então pode, por exemplo, definir-se o lançamento de um novo produto ou serviço, em vez de alcançar um aumento de 10% nas vendas, eliminando gradualmente/faseando uma localização geográfica ao invés de reduzir custos numa região.
Em todo o caso, múltiplas funções podem ser postas em acção para essa iniciativa: de I&D a RH, a Aquisição ou operações; vendas e marketing, todas podem ter actividades que contribuam para que as coisas aconteçam e isso tem de ser intimamente orquestrado através de técnicas rigorosas de gestão de projectos.
Estas iniciativas e as actividades relacionadas são então incorporadas pela estrutura da organização até ao gemba, uma vez que o processo é distribuído em cascata, mantendo a ligação no núcleo.
Fechar a Estratégia - Lacuna de Táticas
À medida que este processo é repetido, é novamente na acção que recai o foco. Cada grupo é chamado a desempenhar o seu papel, que se enquadra na condição visada definida no topo, como peças de um puzzle do tamanho da organização e da tarefa adiante.
Posteriormente, são usados indicadores para assegurar a eficácia da execução relativamente ao objectivo, em vez que medir o desempenho de um grupo.
Integrar o Ciclo PDCA
Aqui é onde se vê claramente que o Hoshin Kanri é também muito apoiado pelo conceito PDCA:
- A maneira como o desdobramento é construído num Plano (Plan) muito detalhado, desenvolvido pela liderança, com o seu compromisso, em cascata pela organização até todos os envolvidos, em qualquer nível;
- O foco na Execução (Doing) de cada item de acção em cada plano e o acompanhamento próximo da liderança, que inclui não só a própria tarefa mas o seu impacto;
- A integração de uma Fiscalização (Check) regular no processo para que tanto as tarefas sejam executadas como o seu impacto verificado face à expectativa inicial;
- A aplicação de ajustes (Adjust), onde necessários, em forma de contra-medidas derivadas de uma análise detalhada, feita atempadamente para que não se prejudique o objectivo geral de forma alguma.
A Metodologia
O Hoshin Kanri é um quadro para a execução estratégica que geralmente segue o ciclo anual com a visão e direcção corporativa.
A primeira fase centra-se no próprio desdobramento, dividindo a visão estratégica em prioridades estratégicas principais que precisam de passar para os próximos 3 a 5 anos para que, cada ano, no mínimo, a estratégias que serviu de base para os anos anteriores seja revista e reajustada para o seguinte ciclo anual, de modo a garantir a continuidade estratégica.
Por meio da matriz X, uma reflexão sobre o clima, existe uma forte correlação entre cada e o próximo, e o processo não é movido adiante, a menos que uma forte correlação seja antecipada.
O próximo passo parte as prioridades estratégicas nas suas iniciativas anuais relacionadas, fazendo a ligação à peça táctica. Ao responder à questão “o que precisa de acontecer para que a nossa visão se materialize?”, a equipa passa do pensamento desejoso para a acção e necessidade de fazer as coisas acontecer.
Neste ponto, a equipa é chamada a calcular como pode medir o progresso e impacto dessas iniciativas, não na tentativa de medir o sucesso da estratégia mas o resultado de cada uma das iniciativas selecionadas, o que motiva a responsabilidade e a execução da própria iniciativa.
Tendo isto claro, a equipa deve ser capaz de definir a extensão do impacto na métrica escolhida, e como o “sucesso se pareceria” para cada uma das iniciativas. Isto é, então, definido como os alvos individuais.
O desdobramento inicial está agora completo e o foco é claramente em como materializar essas iniciativas que, por sua vez, iram conduzir as mudanças que levarão à visão desejada. Agora que está determinado o “o quê” de forma que contribui claramente para o objectivo, está na altura de definir o “como”, “como é que vamos fazer isto acontecer?”.
Os gestores devem perceber que as iniciativas são cruciais para alcançar a visão estratégica e devem procurar formas de as alcançar, pelo que é hora de pensar em recursos e obstáculos que devem ser tratados com antecedência. Isto foi o que aprendemos a chamar de processo de apanha bola, onde os gestores “apanham a bola” e a devolvem à liderança para esclarecimento, compromisso e resolução de problemas cedo no processo.
Plano de Acção
Agora que já foram abordadas as preocupações, é altura de estabelecer planos de acção que vão constituir o mapa para cada uma das iniciativas, e, por sua vez, vão gerar projectos menores ao longo da organização numa cascata tão profunda como a própria organização.
Como qualquer plano de acção que se preze, as tarefas são identificadas na sequência pela qual devem ocorrer, a sua duração estimada e um proprietário atribuir para a seguir.
Gráfico de Bowling
Uma vez estabelecidas no tempo todas as tarefas para cada iniciativa, a equipa deve ser capaz de estimar o tempo e tamanho do impacto nos indicadores-chave identificados, para que possa estabelecer uma previsão intimamente ligada ao plano de acção e ao impacto esperado de cada actividade.
Após a divisão do desdobramento estratégico em planos de acção e a determinação de uma previsão para os indicadores relacionados, o processo muda de foco, oferecendo uma estrutura para o acompanhamento da execução e um meio de correcção de qualquer desvio encontrado.
A execução é rigorosamente rastreada e seguida em cada nível da organização que flui para a estratégia. Tanto os planos de acção definidos com a previsão para os indicadores escolhidos para determinar a eficiência dessas medidas, são avaliados, no mínimo mensalmente, pela equipa e pelos seus líderes imediatos.
Contramedidas
Como em qualquer peça da cultura Lean, os líderes são instrutores para as suas equipas, pelo que, à medida que as iniciativas são examinadas, o grupo pode ser posto a corrigir desvios do cronograma ou dos indicadores.
Se as acção não puderem ser executadas de acordo com o plano ou os indicadores saírem curtos, mesmo que a tarefa tenha sido implementada com sucesso, a equipa é chamada a analisar as causas-raíz e propor ajustes ao plano para que os resultados possam ser retomados sem comprometer, dentro do possível, a iniciativa ou a prioridade estratégica a que está ligada.
Estas contramedidas são trazidas à atenção das outras equipas, que lidam com iniciativas paralelas, para apoio e cautela.
Resumindo
Não é surpreendente que o Hoshin Kanri seja finalmente compreendido, não como uma metodologia da Melhoria Contínua, mas como uma abordagem disciplinada, sistemática e totalmente integrada à implementação de estratégias, independentemente do que sejam.
O Desdobramento Estratégico, a maneira como está configurado, não só garante o foco total e alinhamento para a execução. A sua metodologia combina com o método científico ou PDCA, assegurando que a organização se mantém atenta e flexível a mudanças, e pronta para fazer ajustes ao curso, tornando-a crítica no actual volátil ambiente empresarial.
É por isso que o Hoshin Kanri, em tempos associado ao Lean Management, é hoje claramente visto como um forte apoio a qualquer programa estratégico onde uma rigorosa execução e adaptabilidade são chave.
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